Paulo R. S. Mazarem
O Filme “Terra Vermelha" de 2008, direção e
Roteiro do chileno Marco Bechis, bem
como os demais roteiristas Luiz
Bolognesi, Lara Fremder foi produzido com a finalidade de dilucidar a
realidade enfrentada pelos índios Guarani-
Kaiowá e descrever a perda espacial de seu território no Mato Grosso do Sul,
expropriado pelos Juruás (homens Brancos).
A co-produção ítalo-brasileira Terra Vermelha, é uma obra com teor
político, e torna-se quase que indispensável por assim dizer para quem deseja
compreender a questão e realidade indígena de nosso país. Ele descreve como a
nova geração de índios, isto é, os jovens reagem diante de um novo sistema que
lhe é imposto, onde seu trabalho, cultura e religião não possuem valor algum,
efeitos esses decorrentes das apropriações indébitas de terras que em outrora
eram suas por nascimento, para não utilizar o termo “direito” que nesse caso,
não era um saber do conhecimento indígena, bem como muitos outros saberes cartesianos.
A consequência nessa desterritorialização
provoca no espirito comunitário indígena como um todo uma espécie de angústia
psíquico-social, pois expropriados e sem local para caçar e viverem são
forçados a viverem a beira das estradas e a depender do sistema capitalista que
os objetiviza comprando sua mão de obra em troca de alguns trocados que mal dá
para gerir a subsistência dos ali acampados. O filme relata que essa situação,
(situação de muitos índios) levou os índios a formarem uma base de resistência
na proximidade das fazendas, local (is) esse (s) que eram espaços seus e ali,
organizarem-se para retomar os espaços perdidos.
No entanto, a condição econômica lhes é
desfavorável o que leva muitos deles a se retirarem da base à procura de
empregos temporários, isso para que não pereçam de fome. A imobilidade dos
índios não é suficiente para avanços políticos e geográficos e muitos deles
acabam se tornando alcoólatras como é o caso de Nadio (Chefe da tribo), a tentação pelo êxodo é maior que a
resistência estática e a vontade de existência supera o ativismo, o que faz com
que alguns deles saiam do campo, que outrora era mato, e tenham contato com a
considerada civilização produtora de bens de consumo. O filme ainda mostra a [2]reificação e o fetiche
exercido pela mercadoria sobre os jovens indígenas que no afã de adquirir
certos produtos não sabem que estão por se inscrever em uma nova modalidade
social. É o caso do filho de Nadio
que se suicida, quando retorna para o lar depois de uma longa [3]jornada de trabalho sem o
dinheiro e com um par de tênis branco nos pés.
O filme mostra uma reterritorialização
forçada dos indígenas nos espaços a beira da estrada, ao lado das cercas do dono da fazenda, no caso o chamado
“Moreira”, filho do fazendeiro que ocupara aquelas terras inicialmente, local
este que o próprio Moreira reclama no filme como sendo território seu, cuja
localização já está inscrita como sendo da terceira geração o que inclui
obviamente seus filhos, no caso sua filha como é por ele mencionada.
Porém, diferente de Moreira, os índios
mostram que sua relação com a terra não é a de posse como o homem branco ab-roga
para si, quebrando a lógica cartesiana os índios, mostram que a terra tem a
mesma dignidade que eles, razão essa pela qual eles se sentem parte dela. O filme ainda registra que a perda da
floresta ancestral e o confinamento em lugares reducionais, só servem para
reafirmar a tese do quanto à noção de espaço e terra difere do índio para o
homem branco.
Como é óbvio o diretor não poderia
deixar para trás aquilo que além da terra integra o índio ao convívio comum, no
caso sua crença religiosa. O Xamã da tribo ao perceber em um jovem índio
características de um futuro sucessor, inicia-o e começa a espiritualizar lhe,
ensinando-lhe a rezar e processualmente incutindo-lhes as práticas de suas crenças
religiosas, transmitidas de geração para geração. No entanto, os acontecimentos
que acompanham o jovem Xamã servem para mostrar o quanto sua vocação religiosa
é falseada, isto é, colocada sob teste (enquanto tenta meditar e entrar em
contato com os espíritos e Ñhaderu),
pela jovem adolescente filha do fazendeiro, que o seduz com sua beleza e com
suas posses, no caso, uma moto que será a grande instigadora pela curiosidade
do jovem iniciado Xamã a fim de desfrutar das aventuras alternativas
propiciadas pela inventividade do homem capitalista.
O filme ainda descreve o ascetismo que
um Xamã deve possuir para alcançar certas dádivas da divindade, no caso
Ñhaderu, divindade principal que encabeça as demais divindades no cultuo
guarani. O que propõe-nos afirmar que os índios guaranis, são henoteístas e não
politeístas, como é o caso dos africanos que acreditam em outros deuses
(orixás), mas reconhecem uma divindade suprema, a saber Olorum ou Olodumaré.
Nesse caso, tanto Ñhaderu como Olorum não são divindades subalternadas, ou
hierarquicamente semelhantes em posição como as demais divindades, de fato elas
compõem no panteão um lugar de destaque em ambas as culturas religiosas.
Enfim, o chefe da tribo é assassinado
por causa de sua resistência, o que nos leva a presumir que sua morte, é uma
morte arquetípica, isto é, ele é emblemática por descrever a morte de todos
aqueles índios que resistiram à dominação e a desterritorialização causadoras
de um epistemicidio que ecoa em todas as dimensões da vida ecosófica dos índios.
Portanto, devo dizer que para uma melhor
análise e por certo uma rememoração por todos aqueles que assistiram ao filme
seguem aqui o elenco do filme Terra Vermelha. O Elenco que é composto por Claudio
Santamaría - Lo Spaventapasseri; Alicelia Batista Cabreira – Lia; Chiara
Caselli – Fazendeira; Abrisio Da Silva Pedro – Osvaldo; Ademilson Concianza
Verga (Kiki) – Ireneu; Ambrosio Vilhalva – Nadio; Mateus Nachtergaele – Dimas; Fabiane Pereira
Da Silva – Maria; Nelson Concianza - Lo
Sciamano; Poli Fernandez Souza – Tito; Leonardo Medeiros – Fazendeiro; Inéia
Arce Gonçalves - La Cameriera e Eliane Juca Da Silva – Mami.
By
Paulo Mazarem
Terra Vermelha. Disponível em < : https://www.youtube.com/watch?v=nOCFZWF_Wb4 > Acesso: 09 Jun. 15
[1] Bacharel em Teologia (Fatecamp),
Graduado em Teologia Sistemática (Facasc) e Cientista da Religião
(USJ).
[2]
Reificação de acordo com o
filósofo Paulo Ghiraldelli parafraseia a concepção Marxiana dizendo que
reificação ocorre todas as vezes que uma coisa criada passa a dar ordens àquele
que o criou no caso o homem. Isso significa coisificação do sujeito e subjetivização
do objeto.
[3] O suicídio do jovem filho do líder da
tribo leva o espectador num primeiro momento sugerir que a morte, isto é, seu
suicídio foi causado pela repressão do pai, o que nos leva para uma segunda
questão, como já colocada aqui de pensar que o causa não é o consumo e sim a
Desterritorialização desse índios de seu lugar.
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