Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de março, 2021

SÓ PENSA NAQUILO?

     A lista dos sete pecados capitais não consta da Bíblia Sagrada, como todos sabem. Aliás, foi o monge grego Evagrius do Ponto, no contexto do movimento monástico no deserto do Egito do século IV quem primeiro identificou o que considerava ser, as principais paixões humanas.         Na verdade, foi no século VI que o papa Gregório Magno consolidou a lista clássica registrada no catecismo do catolicismo romano que procurou amplificar o assunto, encontrando na teologia a gravidade destas disfunções, numa lista que hoje é bem conhecida. Por certo, desde o século XVII, a lista dos pecados capitais, melhor aceita, está assim estabelecida: “soberba, avareza, luxúria, ira, gula, inveja e preguiça.”        Como o foco da nossa reflexão e análise será o “pecado da luxuria”, já vamos adiantando que luxuria não é sinônimo de “luxo” como muitos pensam e nada tem a ver com uma vida próspera, isenta de preocupações de ordem financeira.      Todavia, iremos no concentrar na luxúria que até onde se

RUMI E O ENCONTRO LUMINAR COM SHAMS TABRIZI

                                              Levante suas palavras, não sua voz. É a chuva que faz as flores crescerem, não os trovões.   Ele não era certamente um muçulmano convencional. Tendo recebido do próprio pai o título de Maulana, que significa “Nosso Mestre”, é considerado um dos pilares do sufismo, o núcleo místico do Islã. Foi o criador da famosa dança giratória dos dervixes e autor de alguns dos mais apaixonados poemas da literatura espiritual. Foi contemporâneo do muçulmano Ibn Árabi (1165-1240), dos cristãos Francisco de Assis (1182-1226) e Tomás de Áquino (1225-1274) e dos judeus Abraham Abulafia (1240-1291) e Moisés de Léon (1240-1305). Na verdade, Maulana Jalal ud-Din Rumi, nasceu em 30 de dezembro de 1207, três anos depois da morte de RAMBAM, um dos maiores mestres que o judaísmo produziu. Trata-se de uma sincronia, no mínimo providencial.    O pai de Rumi, Baha ud-Din Walad, era um teólogo ilustre e renomado mestre sufi que em decorrência da iminente invasão das hor

DESCLERICALIZAÇÃO

A desclericalização é um fenômeno pós-reforma e pró-iluminismo que desencantou (parcialmente) as sociedades cristãs daquela concepção sagrada de mundo, bem como do binarismo típico das tradições culturais ancestralizadas.   Afinal quem são os secularizados da sociedade senão os ateus alguém pode presumir? Se bem que "secularização" não é sinônimo de ateísmo, mas separação do laico do clerical. O que em tese significa dizer que o estado (brasileiro, por exemplo) não é anti-religioso, e sim anticlerical.   É óbvio que o anticlericalismo não exclui o imprinting (Morin) cultural já posto e impregnado no DNA cívico-moral pelos lugares onde o cristianismo se estabeleceu. O que nos leva a problematizar o famoso enunciado Nietzschiano da morte (simbólica) de Deus, proposta com a chegada da modernidade ou até mesmo aquilo que em sociologia da religião tem se denominado "revanche de Deus". A questão é que nunca houve, a meu ver revanche! O que sempre existiu foi projeções

DOIS GUARDAS: UM COXO E UM CEGO

Um rei tinha um lindo pomar com maravilhosas árvores frutíferas, para que ninguém furtasse as suas belas frutas, ele decidiu colocar dois guardas: "um coxo e um cego".     Ambos eram responsáveis para que ninguém furtasse as frutas do rei. Um belo dia o coxo disse ao cego: Que lindas frutas nos temos na nossa frente, por que não nos deliciemos com elas? Respondeu o cego: E por que não? Traga-me uma. Impossível, replicou o coxo, você não vê que eu sou coxo, não posso subir na árvore. E eu, suspira o cego, poderia eu ver para colher?   A partir deste dia ambos começaram a arquitetar uma forma de concretizar o plano de ação, até que encontraram uma solução. O coxo montou em cima do cego, alcançaram as arvores que tinham em mira, arrancaram o quanto lhes deu vontade e encheram os bolsos, os cestos, retornando cada um para o seu lugar como se nada tivesse ocorrido.   Dias depois, o rei apareceu inesperadamente e reparou o acontecido. O que fizeram com as frutas desta e daquela árv

OS PERIGOS DA COMPARAÇÃO

Quem nunca utilizou a comparação como uma medida para avaliar, classificar ou valorar os comparados? Quem nunca viu neste modelo de pensamento a possibilidade de descrever os objetos ou sujeitos equiparados?    A questão é que neste processo ou esquema de pensamento perdemos do horizonte uma série de fatores que arbitrariamente não coexistem com a realidade dos que sub-júdice são colocados. É por isso que quase sempre, nenhuma comparação é isonômica e hifenizada. Na verdade, toda comparação é verticalizada, assimétrica, descontextualizada e injusta.    É assimétrica porque não nivela qualidades, habilidades ou a cultura do comparado, verticalizada porque esta posta de cima para baixo, descontextualizada pois não leva em consideração o contexto dos contrastados. E finalmente, é injusta, porque solapa processos históricos, currículos, invisibilizando acessos que foram permissivos para uns e ilícitos para outros.    Em suma, comparações seguem um fluxo que desconhece e ignora as composiçõ

SÖREN KIERKEGAARD, O OPOSITOR DE HEGEL?

Não há verdade verdadeira que não seja subjetiva, isto é apropriada.   Afinal de contas, quem é o pai do existencialismo? Já ouvi muitos afirmarem que é Jean Paul Sartre, outros Dostoievski, mas será mesmo?    Com o fim de responder essa questão, é preciso dizer, sem rodeios, que o pai do existencialismo é o teólogo dinamarquês Sören Kierkegaard. Depois, da Primeira Guerra Mundial ele se tornou um dos autores mais lidos e estudados, primeiro na Alemanha e depois no mundo inteiro. Um dos maiores estudiosos de Kierkegaard na Europa é o italiano Cornélio Fabro.   Sören Kierkegaard, ante de tudo, é um dos mais violentos opositores de Hegel. Vivendo e escrevendo na Dinamarca, também contagiada pela imensa influência de Hegel, participa da reação contra ele, liderada por Feuerbach e Marx e outros jovens hegelianos. Mas enquanto Feuerbach e Marx criticavam o idealismo e o espiritualismo de Hegel, Kierkegaard investe contra o universalismo abstrato e o racionalismo dialético de Hegel.   O pont

EU e TU - MARTIN BUBER

  Martin Mordechai Buber nasceu em Viena, 8 de fevereiro de 1878 – Jerusalém, 13 de junho de 1965) foi um filósofo, escritor e pedagogo, austríaco e naturalizado israelita, tendo nascido no seio de uma família judaica ortodoxa de tendência sionista. Buber era poliglota, em casa aprendeu ídiche e alemão; na escola judaica, estudou hebraico, francês e polonês/polaco. Sua formação universitária deu-se em Viena.   BIOGRAFIA     Junto desta família o jovem Buber teve a chance de experimentar a união harmoniosa entre a tradição judaica autêntica e o espírito liberal da Haskalah. A atmosfera era propícia para uma piedade sadia e para um profundo respeito pelo estudo. Teve aí a oportunidade de aprender o hebreu, de ler os textos bíblicos e de tomar contato com a tradição judaica. A filosofia, sob a forma de dois livros, marcou sua primeira e influente presença na vida de Buber entre seus 15 e 17 anos. Nesta época, como ele mesmo nos relata, o seu espírito estava tornado por idéias de tempo e d