Entre gregos e bárbaros, de fato, existiram muitos legisladores e também
inúmeros doutores e filósofos afirmando oferecer a verdade. Não nos
lembramos, porém, de nenhum legislador que tenha podido produzir tal
afeto e dedicação nas almas dos povos estrangeiros a tal ponto que estes
aceitassem livremente as suas leis ou com toda a alma defendessem as suas
intenções. Ninguém houve também que tenha podido sugerir ou dar a
conhecer aquilo que lhe pareceu ser a verdade, não digo a muitas nações
estrangeiras, mas nem mesmo sequer a um só povo, para que todos
alcançassem a sua ciência ou a sua fé.
E, no entanto, não se pode duvidar
que os legisladores gostariam que suas leis fossem obedecidas por todos, se
isto fosse possível, e que os mestres apreciariam que aquilo que lhes
pareceu ser a verdade fosse também conhecido por todos. Sabendo,
porém, que não seria de nenhum modo possível que neles subsistisse
tamanha virtude que fosse capaz de convidar as nações estrangeiras à
observância de suas leis ou de suas afirmações, nem sequer ousaram
começar a fazê-lo, para que não ficassem conhecidos como imprudentes
por semelhantes iniciativas ineficazes e inexecutáveis.
São, no entanto, multidões inumeráveis, em toda a face da terra, em toda a
Grécia e em todas as demais nações estrangeiras, aqueles que,
abandonando as leis de sua pátria e aqueles que consideravam deuses, se
entregaram à observância da lei de Moisés e ao discipulado e ao culto de
Cristo, e isto não sem um grande ódio levantado contra si por parte
daqueles que veneram os simulacros, a ponto de serem freqüentemente
atormentados por parte destes e algumas vezes inclusive conduzidos à
morte. Mesmo assim, abraçam e observam com todo o afeto a palavra do
ensinamento de Cristo.
É verdadeiramente admirável como em tão breve tempo esta religião
cresceu pelo sofrimento e pelo martírio de seus seguidores, pela violência
que lhes foi feita e pela paciência com que toleraram todo gênero de
suplícios. Mais admirável ainda é que seus doutores não são nem eruditos
nem numerosos e, no entanto, esta palavra é pregada em toda a terra, de
modo que gregos e bárbaros, sábios e ignorantes, recebem a doutrina
cristã. Não há dúvida de que isto não se realiza por força ou obra humana.
A palavra de Cristo Jesus se fortalece com toda a fé e poder junto a todas
as mentes e junto a todas as almas. Ademais, é manifesto que todas estas
coisas foram preditas e confirmadas por Ele, quando disse em seus divinos
oráculos: "Por causa de mim sereis conduzidos à presença de
governadores e juízes, para dar testemunho perante eles e perante as
nações". (Mt. 10, 18)
E também: "Este evangelho será pregado em todas as
nações". (Mt. 24, 14) E novamente: "Muitos me dirão naquele dia:
`Senhor, Senhor, porventura não foi em teu nome que caminhamos e
bebemos, e em teu nome que expulsamos demônios?'
E eu lhes direi: "Afastai-vos de mim, vós que operais a iniquidade, nunca vos conheci".
(Mt. 7, 22-23)
Se todas estas coisas tivessem sido ditas por Ele, mas sem que se tivesse
realizado o que havia sido predito, pareceriam talvez menos verdadeiras,
embora tivessem mesmo assim alguma autoridade.
Agora, porém, preditas
com tanto poder e autoridade e tendo chegado à sua realização, fica
manifestissimamente declarado ser verdade que Ele, ao fazer-se homem,
veio trazer aos homens os preceitos da salvação.
E o que deveremos dizer sobre o que, antes dEle, os profetas predisseram
sobre Ele? Estava escrito que não cessariam os príncipes de Judá, nem os
soberanos de seu meio, até que chegasse aquele a quem teria sido confiado
o reino, e até que viesse a expectação dos povos (Gen. 49, 10).
Pelo que
hoje pode observar-se, tudo isto é mais do que manifesto pela própria
história. Desde os tempos de Cristo não há mais reis entre os judeus.
Todas aquelas ambições judaicas nas quais tantos se jactavam e se
exaltavam, seja do decoro do Templo, seja dos famosos altares, de todos
aqueles aparatos sacerdotais e vestimentas pontifícias, tudo isto foi
destruído. Consumou-se assim a profecia que dizia:
- "Os filhos de Israel ficarão durante muitos dias sem reis e sem príncipes, sem sacrifício e sem altar, sem sacerdócio e sem respostas". (Os. 3, 4)
Utilizamos estes testemunhos para aqueles que, no que diz respeito às
coisas que foram ditas no Gênesis por Jacó ao falar de Judá (Gen. 49, 10),
parecem afirmar que ainda haveria um príncipe da descendência de Judá,
que seria aquele que é o príncipe de seu povo e ao qual chamam de
Patriarca, os quais afirmam também que não poderá faltar alguém que
permaneça de sua descendência até o advento do Cristo, conforme o
descrevem para si mesmos. Mas se é verdadeiro o que diz o Profeta,
segundo quem
"por muitos dias os filhos de Israel, permanecerão sem rei e sem príncipe,
nem haverá sacrifício, nem altar, nem sacerdócio", e se, de fato, desde que
foi destruído o Templo, não se oferecem mais sacrifícios, nem se
encontram altares, e se consta também não haver sacerdócio, é mais do
que certo que "faltam os príncipes de Judá", assim como estava escrito,
"nem há soberanos em seu meio, até que venha aquele a quem foi confiado
o reino". (Gen. 49, 10)
Consta, porém, que já veio Aquele a quem foi confiado, Aquele em que
reside a expectação das nações, e que tudo isto parece manifestamente
consumado pela multidão daqueles que, de diversas nações, por meio de
Cristo, creram em Deus.
Pr. Paulo Mazarem
11 Jan. 20
Florianópolis
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